Uma e outra sentimentalidade

23 março 2011
Era dia de festa para todo mundo e não para mim. Estava triste ainda e continuaria assim por todo o dia. A praia estava calma pela manha e o sol quase não aparecia, encobria-se entre as nuvens como eu, que me escondia da falsa felicidade dos outros. Escondia-me dos comentários e dos seus pensamentos, pois nada me importava.
Num momento tentei me afastar do resto do pessoal, sai sozinha a caminhar, e como caminhei, estava absorta em meus pensamentos, como a navegar num mar fluido de sensações e quando dei por mim estava já muito longe. Sentei-me em uma pedra onde havia várias outras, observava a água que batia rapidamente nas pedras, era uma batida forte, brava, a pedra era forte, não se rendia, não tão prontamente. E à medida que a maré subia a força da água ia diminuindo.
Olhei para o horizonte, focava naquele mundo tão distante, tão misterioso e longínquo, mas, que podia ser meu, somente meu. Depois não via mais a água, depois do horizonte. O mundo ficou pequeno, eu via um outro mundo além do horizonte. Nada mais existia, tudo desfez-se como uma névoa se desfaz. Era uma sensação de leveza essa que o horizonte no mar dá. Podia passar horas e horas, dias e dias olhando-o, e embora não parecesse, o tempo passou rápido e quando notei o sol já estava alinhado ao horizonte. Era ainda mais bonito ver como esses elementos se alinhavam, se completavam tão harmoniosamente, as cores eram tão flamejantes que eu percebia um contraste perfeito entre o momento terno e a ideia de fogo que o crepúsculo passava.
O crepúsculo me dava uma tristeza, por que o sol tão forte, irradiante tinha de se pôr? Por que esse momento não é eterno? Eu não via respostas, não queria me desapegar desses momentos, desses cenários. O eterno nos trai tanto. Eu sabia que aquele crepúsculo eu nunca mais veria, e mesmo se eu pudesse registrar jamais teria a mesma performance, os mesmo elementos, o vento na quantidade ideal, a luminosidade, o cheiro da brisa do mar, as ondas, talvez a terra estivesse num ponto diferente de sua órbita. Nada seria igual. Não existem momentos que se repitam em nossa vida. E a despedida desses momentos não é o que dói, é a certeza do nunca mais.
“Nunca mais” é muito difícil de ser aceito. Eu pensava nisso, pensava nas pessoas que deixei na praia pra caminhar sozinha. Pensava na minha gatinha de quem eu tanto gostava, na minha avó, de quem sempre tive o orgulho de ser neta, pensava nas outras tantas pessoas de quem nós gostamos tanto, mas, que na maioria das vezes nós nunca paramos pra dar atenção.
Minha mãe me diz que nós mulheres ficamos mais sentimentais quando nos tornamos mães. Tenho medo de ser mãe. Eu também pensava nisso. É preciso desapegar, inclusive dos filhos para que eles cresçam e se tornem maduros, a vida é mesmo um constante desapegar. Mas isso é para que não soframos tanto, porque sofrer é inevitável sempre. Além de tantas coisas em que eu pensava, eu pensava no sofrimento. Há pessoas que sofrem por tudo, sofrem só de pensar. Eu era assim, sempre fui.
Na época do ensino médio achava normal escutar uma musica triste e chorar. Ler poesia e sentir o que o poeta descreveu. Prefiro os poemas de sofrimento, de tristeza, de angústia. Eles são mais sinceros. A alegria é, na maioria da vezes, superficial. O sofrimento não, ele é sincero. Nunca vi ninguém fingir que sofre.
Eu pensava nisso tudo, em coisas tão imperceptíveis, que as outras pessoas instintivamente já sabiam. As pessoas não pensam no efêmero, mas elas sabem dele. E aproveitam cada instante por que sabem intuitivamente que tudo acaba. Nesse ponto eu era estranha, preferia sentir a viver. Eu não precisava contar a ninguém o que eu pensava e era tão bom ter um segredo comigo mesma. Dava uma paz tão grande ser vazia. Acho que é isso que os outros dizem quando se referem a pessoas leves, pessoas vazias. Vazias num ótimo sentido. Vazias de preconceitos, de regras, de vontades esdrúxulas, de luxos ou de quereres. Quanto mais vazia mais cabem sentimentos nessa pessoa.
Depois de pensar nessas coisas, quis voltar. Achei que era louca. Caminhava de volta tão feliz, realizada. A chutar as ondas, a pegar conchas, a olhar os pássaros. Eu tinha certeza de que havia sido o meu melhor dia. O dia em que percebi que eu só precisava olhar o mar, o horizonte e encontrar comigo mesma para ser feliz.